POLÍCIA ESPANCA SINDICALISTA E IMPEDE MARCHA DOS FUNCIONÁRIOS DE LUANDA
Pré-candidatura de HC pode obrigar JLo a mudar baterias para dentro

A pré-candidatura de Higino Carneiro (HC) surge no início do segundo mandato de João Lourenço (2022-2027), marcado por deslocações sucessivas ao exterior do país – e mal aproveitadas pelos órgãos públicos de comunicação social que, mesmo tendo o privilégio de estar e viajar ao pé do Presidente da República, “desconseguem” a elaboração de uma comunicação profissional e eficaz -, facto que permitiu a abertura de um vazio na política doméstica, ocupado agora pela figura do conhecido general 4×4, com prós e contras, em sites de notícias e nas redes sociais, como um putativo Presidente da República em 2027. A coincidência pode não ser uma mera coincidência. Nós explicamos porquê!
Com prós e contras, HC domina o espaço público
A pré-candidatura de HC está a ser anunciada e replicada em vários sites, com um forte tom negativo contra si, sem um desmentido público da pessoa visada – mas já desmentiu, estranhamente, estar infectado por HIV, tendo, inclusive, cedido um documento pessoal de saúde, que não surgiu no espaço público por mero acaso, ao que tudo indica -, ressalvando teorias conspiratórias (explicamos abaixo).
Isto significa que este movimento pretende congregar suporte dos descontentes do MPLA e entra mesmo nos recentes apoiantes da UNITA. Torna-se assim uma pré-candidatura de arco alargado.
Por outro lado, faz apelos a elementos proféticos. Higino tem o nome do antigo Presidente da República Portuguesa, Higino Craveiro Lopes, uma indicação do pai que, tal como este português, foi general e presidente. Higino também o seria (presidente). E o parágrafo (no seu recente livro, lançado exactamente no limiar do anúncio da pré-candidatura) que faz menção a isso surge também (estranhamente!) a circular nas redes sociais para dar suporte à “profecia”.
Este é um apelo a um forte substracto cultural angolano, indiciando uma campanha populista e demagógica (concorrência ao providencialismo messiânico trazido por Adalberto). Contudo, o Higino português foi um fraco Presidente da República (1951-1958), tendo sido afastado por Salazar, por deslealdade. E andou envolvido posteriormente em conspiratas sem sucesso.
Uma candidatura anti-João Lourenço?
Outro lado da moeda mostra-nos uma pré-candidatura de HC como uma postura anti-João Lourenço. Cita-se: “Higino Carneiro é dado como tendo se insurgido contra a indicação do nome de JLO [como candidato a PR em 2017]”.
Teorias da conspiração
Análises iniciais poderiam dar dois significados distintos a este pré-anúncio:
1. Poder-se-ia pensar ser uma estratégia “maoísta” [“Que flores de todos os tipos desabrochem”] do actual poder político, tendo uma iniciativa deste tipo ter a intenção de fazer sair a terreiro os vários candidatos possíveis contra João Lourenço, de forma a neutralizá-los posteriormente, uma espécie de “purga antecipatória”.
2. Ser uma iniciativa dos opositores de João Lourenço dentro do MPLA, lançando uma “lebre” para mais tarde apresentar outro candidato, mas ocupando desde já espaço público e criando a ideia de que já há alternativa a João Lourenço dentro do partido. Há esta e haverá outras.
HC é um homem forte para o MPLA e para a oposição
Contactos iniciais feitos com algumas fontes referem ser de levar a sério o propósito de HC, afirmando que este tem peso suficiente para avançar. Nestes termos, existem pressupostos, tanto a favor quanto contra, que não podem ser descurados.
Contexto e problemas da pré-candidatura de HC
Sendo séria ou um mero balão de ensaio, o anúncio e desenvolvimento da pré-candidatura de HC tem uma significação política profunda. Demonstra, em primeiro lugar, uma sensação de vazio de poder e inacção que se apoderou do MPLA desde as eleições de Agosto de 2022, um pouco devido ao engajamento do Presidente da República, que se tem focado, com sucesso (embora não noticiado convenientemente), nas relações exteriores, deixando a política interna postergada para segundo plano, não havendo iniciativas significativas.
Criou-se um certo espaço para iniciativas políticas. A pré-candidatura de HC ocupa esse vazio. Toma, em parte, conta do espaço público, mesmo com situações de boemia a seu desfavor. Além disso, a pré-candidatura, ao aparecer já, tenta acelerar o processo histórico, tornando impossível que o Presidente da República se recandidate (prolongue o mandato ou pense em escolher um sucessor diferente).
No fundo, diminui a margem de manobra do PR. A mensagem, em termos simples, é a seguinte: “O PR tem os seus 5 anos. Depois acabou.” É uma mensagem constantemente repetida em vários círculos do MPLA. Importa sublinhar que em termos de representatividade, a pré-candidatura de HC espelha uma tentativa de abrangência, desde os “Santistas” descontentes até votantes cépticos da UNITA.
A primeira reacção da UNITA, por meio de sites manifestamente a favor da candidatura de ACJ nas eleições gerais últimas, é exemplo do medo dessa candidatura. Pudemos ler “… o general Higino Carneiro, figura controversa mas que continua a ser levado ao colo pelos seus camaradas, terá mais de 70 anos, ainda assim, e tal como o pai profetizou, “o soldado da pátria” vê-se a si mesmo a liderar o MPLA e o país”.
Abílio Kamalata Numa, um general da UNITA tido como “homem de guerra”, também já escreveu nas redes sociais contra a figura e história contada por HC (que está agora no silêncio). Isso mostra que Higino Carneiro é uma figura a ter em conta e até temida pelos adversários. Pode ser uma vantagem para os seus objectivos.
É evidente que as falhas e pontos negativos de HC são conhecidos, com destaque para práticas de corrupção e rumores sexuais rocambolescos. Porém, estes defeitos, nos últimos tempos, têm sido desvalorizados na sociedade em relação aos antigos membros da elite “Santista”. Tentou-se criar, até certo ponto com sucesso, a ideia em relação a pessoas como Isabel dos Santos, HC e outros “empresários”: “roubavam, mas faziam”.
Relativamente a HC, existe o benefício de ter sido investigado e “despronunciado”, diferente de Isabel dos Santos que também já manifestou o desejo de se candidatar ao cargo de Presidente da República de Angola, um pouco pela fama que goza: “rouba, mas dá emprego”. Um possível reatamento da pronúncia em tribunal contra HC podia ser visto como clara perseguição política. Agora, o 4×4 pode estar mesmo preparado e com caminho livre para usar a tracção nas 4 rodas.
Vantagens de HC
Do ponto de vista das vantagens de HC, há que destacar o seguinte:
- Entra bem na juventude. O seu feitio boémio e muito trabalho no passado, com provas dadas, tornam-no mais atraente para a juventude. Goza de uma imagem segundo a qual os jovens que trabalharam com ele enriqueceram;
- Tem conhecimento profundo do processo eleitoral angolano. Foi durante muitos anos um dos principais cabos eleitorais do MPLA, obtendo vasta informação sobre o funcionamento das eleições;
- Tem uma imagem conciliadora nas Forças Armadas, tendo sido responsável por vários momentos decisivos na história destas.
- É uma pessoa urbana;
- Terá proximidade com vários generais e figuras maiores da UNITA, que ajudou a enriquecer.
Isto tudo quer dizer que politicamente este anúncio deve ser levado a sério – não veio por mero acaso – no sentido que as forças internas de oposição do PR, aproveitando algum vazio de iniciativa doméstica, se estão a organizar e a procurar candidatos com um perfil conciliador que absorva desde “Santistas” a “Adalbertistas”: alguém urbano, com boas ligações nas Forças Armadas, boa penetração na juventude, etc.
HC poderá ficar pelo caminho, entretanto, se os seus defeitos prevalecerem, mas abre claramente caminho para a sucessão no MPLA e a retomada do poder por parte das forças do “statu quo ante”.
Somos de opinião que o PR deveria tomar fortemente a iniciativa interna, em termos de política doméstica (emprego, rendimentos das famílias, saúde, educação), renovação do partido MPLA e prestar maior atenção à comunicação do seu partido e do Executivo, no geral, e talvez propor mudanças na Constituição, para permitir candidaturas independentes, que há muito se deseja. Caso contrário, poderá tornar-se já, e para os próximos 4 anos, aquilo que os politólogos americanos chamam de um “lame duck” [um dirigente político eleito, cujo sucessor já foi eleito ou será em breve. Um político que costuma ser visto como tendo menos influência sobre outros políticos devido ao tempo limitado que resta no cargo].